domingo, 2 de novembro de 2008

20 anos da “Batalha de Suzuka”

20 anos da “Batalha de Suzuka”
30 de outubro de 2008 - 13:24
Foto: Reprodução Grande Prêmio
Vejo agora, no Grande Prêmio, que lá se vão 20 anos da conquista do primeiro mundial de Ayrton Senna, no GP do Japão de 1988. É impressionante como o tempo passa rápido e também como a lembrança daquela corrida permanece viva.
Tinha 11 anos na época e lembro nitidamente de ter pela primeira vez na vida a sensação de estar presenciando algo histórico. Muitos fatos acontecem, acompanhamos, mas só nos damos conta da dimensão deles dias, meses, às vezes anos após. Neste caso, não. O mundo inteiro, em 30 de outubro de 1988, teve a certeza de estar vendo uma das maiores páginas da história do automobilismo ser escrita na pista de Suzuka.
Como já disse no GP Total no começo deste ano, aquela conquista teve um ar heróico, improvável, uma sensação que pode ser equivalente a uma virada aos 48 do segundo tempo de um time estava perdendo de goleada há poucos minutos. Comparável, quem sabe, à Batalha dos Aflitos, quando não há quem não tenha ficado impressionado com aquele time que na casa do adversário, com quatro jogadores a menos e um pênalti contra, conseguiu defender o pênalti, fazer um gol e voltar para a casa com o título na mão.
A “Batalha de Suzuka” foi assim. Ayrton Senna era pole, deixou o carro morrer na largada, caiu para 14º e viu suas chances no campeonato minguarem. E, de forma inesperada, tirou todos de sua frente em menos de 20 voltas para voltar a brigar, no mano a mano, com Alain Prost. É lógico que a McLaren era o melhor carro daquele ano, mas isso não diminui o feito. Ultrapassar seis carros em uma volta, como fez na primeira, não é para qualquer um. Mais dois na segunda volta, mais um na terceira, outro na quarta… Uma escalada para a história, rumo à vitória, rumo a uma conquista épica.
A Folha de São Paulo foi muito feliz quando avaliou hoje que o GP do Japão de 1988 iniciou a mitificação de Ayrton Senna. É certo que o brasileiro teve um acompanhamento midiático até então inédito, é sabido também que frente às câmeras se tratava de um sujeito bem mais polido, bom moço e simpático do que na vida real, narrações gritadas e ofegantes sobre trilhas emocionantes ajudaram a construir o ídolo, a morte à-la James Dean gerou uma comoção mundial. Mas não é só isso que explica a adoração ao gênio. Não adianta bela embalagem sem um bom produto, e Senna foi um produto único oferecido pela Fórmula 1.
Somos apaixonados pelo automobilismo e não devemos entrar na conta, mas coloque-se no lugar de um leigo, alguém que apenas vê carrinhos dando voltas e nada mais. Para quem não tem velocidade nas veias, corridas são chatas. E são chatas mesmo… um sai na frente, troca de pneus, reabastece e ganha. De vez em quando uma ultrapassagem, uma quebra, mas superficialmente tudo não passa de carrinhos dando voltas sem sair do lugar. O vencedor é um cara chato que, como dizia Juan Manuel Fangio, anda na frente “o mais devagar possível”. O segredo da vitória é esse, ser rápido o suficiente para vencer a concorrência e lento o suficiente para não danificar o equipamento. E Ayrton Senna fugiu deste clichê. O modo como se deram algumas de suas conquistas, a começar por Suzuka em 1988, trouxeram aquela analogia da virada futebolística para o automobilismo. E todo mundo passou a acompanhar a Fórmula 1, esperando a cada domingo uma vitória improvável.
Ou há outra forma de classificar o que fez em Mônaco/1984, um novato ultrapassando todo mundo com um carro visivelmente inferior debaixo de um temporal? Ou sua primeira vitória em Interlagos, percorrendo todo o traçado nas últimas voltas com seu câmbio preso à sexta marcha? Ou o duelo com Nigel Mansell em Jerez de la Frontera, cruzando a linha de chegada separados por apenas 14 milésimos de segundo? E o outro duelo com o Leão em Mônaco/1992, segurando a Williams de outro planeta por cinco voltas no final da corrida? E a vitória no dilúvio de 1993 em Interlagos, uma corrida que Alain Prost tinha na mão? A primeira volta em Donington Park e a vitória com duzentas trocas de pneus?
Ayrton Senna pode não ter sido o melhor piloto da história. Quem briga defendendo ou rejeitando tal idéia não sabe o que está fazendo, até porque essa questão de “melhor” é por demais subjetiva. Mas não há dúvidas que foi ele o piloto que mais protagonizou aquilo que se pode chamar de “vitórias impossíveis”. E o impossível começou a ser possível em Suzuka, em 30 de outubro de 1988.

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